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Tenho 73 anos. Vivi a ditadura. Vivi a censura. Vivi a guerra. E hoje, com amargura, vejo tudo isso a regressar — mas disfarçado, com bandeiras azuis e discursos pomposos sobre liberdade e democracia. É mentira. A Europa não é democrática. E o mais grave é que usa a ignorância do povo como arma de controlo. Não o digo de ânimo leve.

Digo-o porque está à vista de todos. Ou melhor: estaria, se nos deixassem ver.

Proíbem canais russos, bloqueiam opiniões que não se alinham com a narrativa oficial, acusam de desinformação qualquer tentativa de questionar o que vem de cima. Como pode haver democracia, se só nos deixam ouvir um lado da história? A verdadeira democracia permite que o povo decida por si. Aqui, decidem por nós, e quem ousa pensar de outra forma é silenciado, rotulado, marginalizado.

Durante anos, criticaram — e bem — a extrema-direita. Hoje, sentam-se à mesa com ela. Fizeram da denúncia da intolerância um instrumento político, mas agora, perante um “inimigo comum”, esquecem tudo. Apoiamos regimes que acolhem abertamente forças neonazis. E se alguém aponta o dedo, é imediatamente censurado ou ostracizado. Falo da Ucrânia, sim. Mas falo sobretudo desta Europa hipócrita que enterra os princípios em nome da geopolítica.

Li, como muitos deveriam ler, o texto do Major-General Carlos Branco, publicado a 6 de Março de 2025 no Jornal Económico, intitulado «O Pacto com o Diabo». É um documento que não deve ser ignorado.

Carlos Branco acusa o Ocidente de lavar a imagem de um regime onde forças neonazis têm espaço, poder e legitimidade. Aponta a repressão interna na Ucrânia, a perseguição religiosa, o encerramento de partidos, a censura. Aponta símbolos nazis visíveis em batalhões armados. E pergunta, com razão: é isto a democracia que estamos a defender?

Não se trata de defender Putin, nem de alinhar com narrativas de guerra. Trata-se de ter coragem de dizer que há algo profundamente errado na forma como a Europa escolheu os seus aliados e silencia quem levanta dúvidas. O que antes era condenado com veemência, hoje é tolerado. E quem ergue a voz é acusado de trair “os valores europeus”.

Eu pergunto: que valores são esses, afinal? Os valores que defendem um actor-fantoche, sustentado por dinheiro ocidental e rodeado de símbolos do nazismo? Os valores que silenciam canais, expulsam opiniões, proíbem partidos, e perseguem sacerdotes ortodoxos?

Tenho vergonha. Vergonha de ver a liberdade de expressão ser pisada por quem jurava defendê-la. Vergonha de ver a Europa repetir os erros que jurou nunca mais cometer. Vergonha de ver Portugal a calar-se. Aqueles que estiveram na frente da luta contra o fascismo — e eu estive — sabem reconhecer o cheiro da tirania. E o cheiro voltou.

Estamos a assistir à nazificação progressiva da Europa, ao mesmo tempo que os nossos políticos se vendem a interesses que nada têm a ver com o bem comum. E quem denuncia este “casamento” entre o poder europeu e os novos extremistas é ridicularizado, censurado, cancelado.

Eu não quero morrer já. Mas se tiver de ser, prefiro cair de mais um ataque cardíaco do que assistir calado ao fim da nossa democracia. Porque o futuro que se avizinha é escuro. Não é só uma guerra. É um apagão de gerações.

Hoje, um dia após o desastre eleitoral em Portugal — de consequências tão imprevisíveis quanto perigosas — assistimos ao renascer de fantasmas que julgávamos enterrados. A maioria de direita que agora se ergue tem como objectivo declarado a revisão da Constituição: não para a reforçar, mas para a amputar. É um retrocesso de meio século, um regresso calculado à escuridão de onde com esforço saímos. Preparem-se: a vingança contra os anos de Liberdade já começou, e virá disfarçada de legalidade.

Não digam que não foram avisados. Porque foram.

Manuel Araújo

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