O passado dia 9 de dezembro foi um feliz momento cultural na Livraria Portuguesa de Bruxelas, “La Petite Portugaise”. Juntou dois escritores, dois Joaquins, à volta de um livro sobre a notável escultora, Maria Leal da Costa.
Gostaria de começar este nosso diálogo acerca deste teu bonito livro — GILREU – A Graça na Obra de Maria Leal da Costa — citando um aforismo, ou uma máxima, dos filósofos gregos, que acreditavam que o tempo se encarrega sempre de nos joeirar.
Há pouco mais de vinte anos, quando andava à procura de um editor para o meu primeiro livro, este amigo, Joaquim Pinto da Silva, recebeu-me em sua casa, na Foz do Douro, e, ao subirmos as escadas, abriu-me uma janela e apontou-me um rochedo, em pleno mar, afirmando: “Aquele é o meu Gilreu.”
Uma lufada de ar fresco, com sabor a mar e a infinito, acentuou o mistério de um enigma que eu iria decifrando à medida que o ia acompanhando, ao longo de alguns anos, pelas minhas terras beirãs sabugalenses.
Talvez os astros tenham colocado, em certa medida, um paralelismo nos nossos itinerários, acentuando um acaso de complementaridades, do qual eu me sinto orgulhoso.
Pelas nossas deambulações na raia beirã sabugalense, também eu quis mostrar ao meu amigo, JPS, o meu Gilreu — não no turbilhão de uma foz, a foz do Douro, mas na tranquilidade dos fios de água de uma nascente, a nascente do rio Côa, cujas águas se juntam e banham também o seu Gilreu, desde há milhares de anos.
E a complementaridade desses paralelismos acentuou-se ainda mais quando convidaste a tua grande amiga e escultora, Maria Leal da Costa, e o seu marido, para irmos visitar a minha aldeia natal, onde iria ser apresentado o meu primeiro livro, editado na tua chancela — O Progresso da Foz.
A inspiração do teu Gilreu pairou mais uma vez nestas terras raianas e, com Maria Leal da Costa, tivemos oportunidade de descobrir uma aldeia raiana sabugalense, passeando-nos pela mítica Quelha da Barreira, admirando o centenário almo das Eiras ou descobrindo um mosaico abandonado e maltratado do fontanário da Torre da Igreja, que, graças à ousadia de o termos colocado na capa do meu livro, viria a ser alvo de uma bem-sucedida restauração.
Também eu quis mostrar-vos não um pequeno rochedo no meio do mar, não um Gilreu, mas uma majestosa montanha que assinala a fronteira e o meu infinito: a quase intransponível Marvana, também ela a minha fonte inspiradora, de onde avisto o céu e a terra e sinto as longínquas ondas do mar, que me acalmam, me transportam para um mundo etéreo e me dão a compreensão de tudo.
Agora que falo do teu inspirador Gilreu e da minha musa Marvana, por uma curiosa combinação dos astros, associo o companheiro telúrico da Maria, o seu Marvão inspirador! Assim, o Gilreu da Foz do Douro, o Marvão das planuras de Portalegre e a Marvana das serranias da Gata e da Malcata juntaram-se hoje para descobrir toda a graça existente nesta grande escultora junto de quem o escritor e editor não cessa de se inspirar, como poderemos contatar através dos deslumbrantes comentários que tece à obra de Maria Leal da Costa inseridos neste seu excelente livro.
Joaquim Tenreira Martins


