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Com a recente crise dos refugiados ucranianos, os responsáveis políticos europeus parecem estar naquela situação em que vêem alguém a deixar o seu gabinete e a perguntar: Devo deixar a porta aberta?
De acordo com o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados, cerca de sete milhões de refugiados ucranianos chegaram a solo europeu após o início da guerra na Ucrânia, no final de fevereiro deste ano.
A grande maioria encontra-se em países fronteiriços como a Polónia, a Roménia e a Hungria. Ao contrário do que aconteceu durante a chegada de refugiados sírios, que também fugiam da guerra no seu país, até Viktor Orbán abriu as portas das suas fronteiras aos ucranianos deslocados e ofereceu asilo temporário.
O contraste no tratamento dos refugiados provenientes da Ucrânia com os que chegaram da Síria é flagrante. Desta vez, a União Europeia respondeu a uma só voz. Deu o seu apoio público e político à Ucrânia, disponibilizou fundos, e acolheu os ucranianos de braços abertos.
Entre 2015 e 2016, cerca de um milhão de refugiados do Médio Oriente deslocaram-se para a Europa. Nessa altura, foram recebidos de uma forma menos que afectuosa. Foram chamados de ilegais, deportáveis, terroristas, predadores sexuais, muçulmanos.
Este era o retrato daqueles que chegavam de um país devastado pela guerra, exercendo o seu direito de pedir asilo. O retrato de alguém que estava à procura de um novo lar, de uma nova oportunidade. O retrato daqueles que queriam viver, mesmo que tivessem de recorrer a rotas inseguras e a contrabandistas, colocando em risco a sua família.
Pouco mais de uma semana após o início da invasão russa da Ucrânia, a União Europeia activou a sua Directiva de Protecção Temporária. O texto legislativo permite àqueles que se encontram deslocados da Ucrânia protecção imediata, uma autorização de residência por 1 a 3 anos, e um acesso mais fácil a uma série de áreas como a educação, emprego, e assistência médica.
Para os estados membros, este é um processo que garante agilidade e simplificação para garantir protecção temporária, evitando assim bloqueios pelo sistema de asilo. Solidariedade, tal como na altura do esquema de realojamento de refugiados em 2015, é a palavra de ordem.
Olhando para estas acções, à primeira vista, pode-se mesmo dizer que a Europa aprendeu com os erros do passado. No entanto, talvez isso não seja bem verdade.
Governos como a Dinamarca, que desde 2019 tem vindo a tentar que alguns dos refugiados sírios no país sejam devolvidos, e a Hungria, que aquando do esquema de realojamento de refugiados não recebeu ninguém, são agora acusados de serem xenófobos e hipócritas. Campos de refugiados como os das ilhas de Samos e Lesbos, ambos na Grécia, ainda existem e há quem ainda desespere para ver a sua situação regularizada. Na Bélgica, a crise dos "sem papéis" não europeus arrasta-se durante anos e anos, sem qualquer tipo de fim à vista.
A questão cultural e geográfica da Ucrânia desempenha um papel importante na forma como a Europa está a lidar com esta situação. E não podemos ignorar a questão étnica. Tenho muito pouca fé que se a mesma coisa tivesse acontecido em Marrocos, por exemplo, com o mesmo fluxo de refugiados, se a Europa teria a mesma reacção ou se espelharia o sentimento de 2015. Mesmo na opinião pública. Hoje, não há qualquer sentimento de medo ou ameaça. Não existe a narrativa da "ucranianização" (em contraste com a islamização em 2015) da Europa.
Em questões de migração, a Comissão, juntamente com o Parlamento Europeu, adoptou uma abordagem mais liberal, utilizando uma abordagem à "raiz do problema", promovendo o financiamento sob a forma de ajuda ao desenvolvimento e assistência de vários países, muitos no continente africano.
No entanto, isto vai contra a forma como os estados membros têm olhado para estas políticas, que utilizam uma perspectiva mais orientada para a segurança, com base em controlos fronteiriços e políticas de retorno.
A rapidez da acção da Comissão e dos estados membros relativamente à situação na Ucrânia é louvável. Ninguém deve conhecer o gosto de ter de deixar uma vida para trás. Não contra a sua vontade. Contudo, isto não deve ser suficiente para mudar a forma como os governantes europeus encaram as políticas de asilo e migração.
Sentados nos seus gabinetes, acredito que quando chegar a hora de alguém sair da sala, os decisores europeus irão olhar-lhes nos olhos e dizer: Por favor, fechem a porta.
Luso.eu | Jornal Notícias das Comunidades